Nascido em 1965, numa pequena aldeia de Gando no Burkina Faso, sem acesso à eletricidade, água potável ou salas de aula convencionais, Francis Kéré transformou obstáculos em alicerces. Filho do chefe da aldeia, foi o primeiro da sua comunidade a frequentar a escola, uma jornada movida pela convicção de que a educação seria a verdadeira arquitetura do futuro. Kéré cresceu num ambiente onde construir uma escola era um sonho tão distante quanto improvável. Mas seus pais acreditavam que o conhecimento poderia quebrar ciclos, e foi essa crença que o levou a ser o primeiro da aldeia a ser alfabetizado. Ainda muito jovem, entendeu que a educação seria o alicerce da sua vocação.
Com o apoio de uma bolsa de estudos, Kéré mudou-se para Berlim no final dos anos 1980, onde estudou carpintaria e, depois, arquitetura. As bolsas que recebeu foram frutos de mérito, mas também da sua clareza de propósito: ele não apenas queria aprender, ele queria transformar. Ao invés de romper com as suas origens, cada aula, cada diploma e cada estágio tornaram-se ferramentas para construir soluções arquitetônicas adaptadas às realidades sociais de comunidades desfavorecidas. Seu primeiro grande projeto foi simbólico: construiu uma escola primária em Gando com técnicas tradicionais, mas adaptadas ao clima e materiais locais, projetando espaços ventilados, sustentáveis e esteticamente inovadores. O mundo percebeu a genialidade. Em 2004, Kéré recebeu o prestigioso Aga Khan Award for Architecture, dado a projetos que melhoram a qualidade de vida de comunidades muçulmanas — aliando excelência técnica e impacto social.
Ao longo dos anos, foi acumulando reconhecimentos internacionais não apenas por suas obras, mas pelo que elas simbolizam: uma arquitetura de impacto humano, não apenas estético. O prêmio Global Holcim Award em 2012, o Schelling Architecture Award, o Marcus Prize, o Arnold W. Brunner Memorial Prize… Cada honraria foi resultado de escolhas éticas, de projetos com alma, e de uma vida dedicada a conectar tradição e inovação com dignidade.
Em 2022, o Prêmio Pritzker consagrou sua trajetória, citando não apenas a beleza de suas criações, mas sua coragem em desafiar normas estabelecidas, ao mesmo tempo em que respeitava profundamente o território e a cultura dos povos para quem construiu.
Hoje, ao olhar para sua carreira, compreendemos que não foi o acaso que o levou até o topo, mas um conjunto de valores inegociáveis: honestidade intelectual, humildade, excelência técnica, gratidão e responsabilidade com as futuras gerações. Francis Kéré é mais do que um arquiteto laureado, ele é uma narrativa viva sobre o poder de permanecer fiel à essência, mesmo quando se está diante das mais tentadoras possibilidades de afastamento dela. Sua trajetória é feita de escolhas conscientes: entre a fama e a missão, ele escolheu servir; entre o prestígio e a simplicidade, ele escolheu permanecer enraizado.
Kéré prova que não é preciso negar a origem para alcançar o topo, é preciso entendê-la, valorizá-la e colocá-la a serviço de algo maior. Sua vida ensina que a educação abre portas, mas são os valores que mantêm essas portas abertas. Que estudar, buscar bolsas de mérito e desenvolver excelência técnica é um ato de coragem, mas manter a humildade, a autenticidade e o compromisso com o impacto social é o que verdadeiramente transforma destinos.
Para os jovens africanos, ele representa o exemplo vivo de que é possível ser global sem deixar de ser local. Que é possível conquistar o mundo com um nome africano, um sonho nascido na terra vermelha do interior e uma missão guiada por propósito. Kéré não apenas construiu edifícios. Ele construiu pontes entre tradição e inovação, entre o passado e o futuro, entre a África e o mundo
“Não precisei negar minhas origens para chegar ao topo. Usei-as como fundamento.” – Francis Kéré.” Que cada jovem africano saiba: o mundo precisa da tua verdade, da tua visão e da tua coragem.
