A edição número 1 da revista Ngapa está já nas bancas com uma reflexão profunda sobre as luzes e sombras do poder em Angola e no mundo. Através de disciplinas artísticas, reportagem, ensaio e ilustração, a publicação da editora Kacimbo reflete as relações do poder na política, na sociedade, na economia e na arte. Desde a esfera pessoal e íntima até aos centros de decisão e Palácios Presidenciais.
O “poder” como um todo abstracto determina comportamentos, pensamentos e leis. Rege as principais funções de organização social, política e económica. Há, portanto, que o expor, exibir e pensar. Com esta premissa, a Ngapa número 1 acaba de sair às ruas, aprofundando a reflexão sobre o “poder”, com colaborações de carácter informativo, académico e artístico. “Lukano”, a pulseira-símbolo de poder nas Lundas, dá o mote a esta edição.
A abrir a revista, a rubrica “Montra” expõe os bastidores do poder político com o ensaio “A Nova Divisão Político-Administrativa [DPA] como instrumento de poder e de manipulação eleitoral”. Numa análise profunda, o cientista político angolano Sérgio Dundão demonstra como a nova DPA é um instrumento deliberado de engenharia eleitoral (gerrymandering), “que favorecerá os próprios interesse do Executivo e do partido no poder”.
O poder tradicional versus poder do Estado é a base do texto assinado por Luzia Bebiana Sebastião, “A Realidade Angolana e o Pluralismo Jurídico”. Na rubrica de actualidade “É Hoje”, a professora de Direito Penal na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto evidencia como “a Constituição de 2010 confere ao Costume estatuto de fonte de Direito no país”, mas “não responde como encaixar na democracia participativa o sistema jurídico das Autoridades Tradicionais”.
O poder tradicional volta a marcar a necessária presença em “Mundos”. “Sonhos e desejos eternos à sombra do Jango Grande” encarna as aspirações de três líderes tradicionais Cokwe, face às relações entre o poder tradicional e o poder do Estado. Uma longa conversa do jornalista Miguel Gomes com o rei Mwatchissengue wa Tembo e os sobas Muhuhu e Cafula Moçambique, com a implementação das novas autarquias como pano de fundo.
“Patriarcado, Capitalismo e outras Prisões” é o tema do “Cara-a-Cara”. Duas activistas do movimento feminista – Cecília Kitombe e Fernanda Lacombe – expõem visões muito diferentes, mas complementares, sobre as relações de género e os poderes que desumanizam, hierarquizam e desclassificam.
Desfolhando a secção literária, “Matriz”, a escritora sul-africana Zukiswa Wanner, a poetisa e escritora angolana Irene A’mosi, o escritor nigeriano Chiké Frankie Edozien e a jornalista portuguesa Marta Lança discorrem sobre o poder como arma de morte e dominação sobre corpos e vontades, contrapondo-o com a incontornável resistência, afirmação e luta pessoal ou colectiva.
Fiel ao seu ADN, a Ngapa volta a usar a Arte como elemento transversal. Em “Tocando”, a letra original de “A Town”, música de Ohali com participação de Toy Boy, mostra-nos o poder da cidade. “Três Pancadas” discorre sobre “O Teatro e a afirmação da identidade de um Povo”, um texto assinado por Yannick Pimenta, presidente da Associação Mindelact, de Cabo Verde. E em “Passos”, a coreógrafa e bailarina Elisabete Fernandes aprofunda o poder da memória, capturando movimentos e sensações no regresso à sua Benguela natal, 42 anos depois de emigrar para Cabo Verde. “Desta raiz me parto” é a base de uma coreografia em preparação.
Na secção de cinema, “Câmara”, o realizador angolano Ery Cláver conclui o guião original da curta-metragem “Uma Veia Contraditória”, cuja primeira parte foi publicada na edição 0 da Ngapa.
Num mergulho além das palavras, as ilustrações de Daniel Kuma, Aldair Avedon, Irad Verkron e Zoniriziz unem-se à fotografia de Magno Daniel na foto-reportagem “O Poder do Vazio”, e à fotografia-manifesto “Sapato Bico Fino”, de Rui Magalhães. Estéticas, técnicas e disciplinas artísticas diferentes que mostram o poder dos espaços e o assombro ante os símbolos de poder.
No editorial desta edição, o director da Ngapa, Cláudio Tomás, reflecte: “Quisemos captar o conceito de poder nas suas várias dimensões. O poder percepcionado, os poderes do corpo, da arte, da palavra, os da tribuna. Os pequenos poderes – efémeros, íntimos e subtis – e os grotescos – aglutinadores, que esmagam. Também o poder cego, desmedido e irracional. Do lobo sem olhos que nos mira nas páginas finais com uma atitude de pilhagem e saque. O abraço de morte a um corpo impotente e resignado confronta-nos com o nosso lugar: predador ou presa?”
“Lobo ou cordeiro, o poder não é uma entidade abstracta. Com vários ângulos afilados, complexifica-se. Quem o exerce, enclausura-o atrás de uma porta sem fechadura. Há que abri-la. Aqui, na Ngapa, forçámos a entrada.
”A revista Ngapa está à venda nas livrarias Kiela, Lello e Como tu, em Luanda. Em breve, estará também disponível nas livrarias ULA, no Lubango.Sobre a NgapaLançada em Luanda em Julho de 2024, a NGAPA é uma revista quadrimestral que ambiciona reflectir os desejos do mundo contemporâneo através do jornalismo, ensaio, literatura e artes plásticas e performativas (design gráfico, ilustração, fotografia, música, cinema, dança, teatro, entre outras).
Propriedade da Kacimbo Editora, busca explorar a cultura sob uma perspectiva ampla, com foco nas interacções entre indivíduos, no ambiente que os circunda e nas dinâmicas com as estruturas de poder. Esta visão permite uma análise profunda das nuances que configuram as práticas quotidianas e as formas de organização social, revelando como os indivíduos negociam, se adaptam e resistem.
A Ngapa quer discutir Angola, Angola no mundo e o mundo em Angola. Sem temas tabu, sem certezas absolutas, nem ideologias fixas. Aberta, franca, sem medo do contraditório nem do confronto de múltiplas perspectivas.