Catello Romando tem 33 anos e, a partir da prisão, decidiu licenciar-se em Sociologia. Condenado por crimes ao serviço da Camorra, a máfia napolitana, acabou por usar a tese universitária para fazer uma reflexão da sua infância, para falar sobre a forma como o crime atrai pessoas desfavorecidas e acabou a confessar crimes que eram desconhecidos, nomeadamente três homicídios.
A história ganhou destaque após um trabalho do El Pais, que teve acesso à tese de 170 páginas, que foi escrita a partir da prisão de Catanzaro.
“Chamo-me Catello Romano. Tenho 33 anos e levo quase metade da minha vida na prisão, 14 anos consecutivos. Cometi vários crimes horríveis e fui condenado por homicídios da Camorra. O que se segue é a minha história criminal”, escreveu.
“É também meu objetivo contribuir para a compreensão do fenómeno criminal e, por conseguinte, para a sua possível prevenção. Estou convencido de que as palavras são importantes e este texto tem como objetivo mudar o mundo que nos rodeia”, acrescentou.
O documento, que foi bem classificado e que mereceu honras, acabou também por levar a justiça italiana a reabrir os casos em questão, tendo ainda ordenado que Catello Romando fosse transferido para uma prisão de alta segurança em Pádua.
Os três homicídios, todos eles ao serviço da Camorra, em 2008, são os dois primeiros assassinatos que cometeu, referentes a Carmine D’Antuono e Federico Donnarumma, abatidos a tiro, e de Nunzio Mascolo, membro de um clã rival.
A tese, tal como nota o El País, assemelha-se a um romance autobiográfico, nos quais são relatados episódios relacionados com o ambiente criminal, mas também partilhas sobre educação, infância, divórcio, abandono, drogas, e violência.
Romano, descendente de uma família humilde e que sonhava ser polícia, revela como o divórcio dos pais e a violência diária o levaram a procurar um abrigo, que encontrou na Camorra.
“Conheci intimamente a miséria e a influência negativa que ela pode ter desde a minha infância… Desenvolvi uma certa vontade de refletir e a capacidade de não fazer julgamentos moralistas fáceis e precipitados sobre as pessoas, o que infelizmente não é muito comum”, escreveu.
“Com eles construí a minha nova identidade alternativa de um miúdo duro, com uma máscara para dissimular a minha incapacidade de aceitar a minha fragilidade de adolescente e como forma de sobrevivência num mundo violento e extremo”, lê-se.
É assim que defende que o crime pode atrair os mais desfavorecidos e marginalizados. “É a sua forma de tentar emancipar-se e ganhar mais respeito e reconhecimento social”, frisou.
Entre outros crimes, Catello Romano está a cumprir uma pena de prisão pelo homicídio do vereador Luigi Tommasino, do Partido Democrático de Castellammare di Stabia, um município a sul de Nápoles. O vereador foi morto a tiro, em 2009, quando ia de carro com o filho. Romando escreveu que máfia da Camorra achava que ele se “metia em demasiadas coisas que não lhe diziam respeito”.
Chalie Barnao, professor da Universidade de Catanzaro que orientou a tese de Romano, descreveu-o como um “aluno extraordinário”, que passou por um “difícil processo”.
“Contou em pormenor circunstâncias que terão consequências; estava muito determinado a expô-las na sua tese. Pôs a vida em ordem de uma vez por todas e organizou os episódios vividos para os analisar através de um método de investigação sociológica, que teve também uma espécie de função terapêutica”, notou, em declarações ao diário espanhol.
Sabendo que não terá perdão pelo que fez, Romando exaltar o poder libertador da verdade. “É sempre esclarecedora” e “ajuda-nos a ser corajosos” disse, referindo que fez estas partilhas “na esperança de ter feito algo de reparador para aqueles” a quem fez “mal” e para si “próprio”.